domingo, 23 de outubro de 2016

The Beatles - Please Please Me (1963)

Please Please Me o primeiro álbum, lançado em 22 de março de 63, Parlophone PMC 1201 (mono). Nasceu da idéia de aproveitar o sucesso adquirido com o primeiro lugar de "Please Please Me"/"Ask Me Why", afim de que eles não fossem um grupo de um sucesso só. Foi gravado em apenas um dia e mixado em dois e dispondo de apenas dois canais (sendo que qualquer bandinha de quinta categoria de hoje em dia, usa no mínimo, uns vinte para produzir qualquer bobagem), o que prova que mais que equipamento, é necessário competência, dedicação e sentimento de conjunto. Por isso, Please Please Me, ainda soa atual - no bom sentido, é claro - mesmo depois de tantas décadas. Ninguém conseguiu fazer um disco tão bom em sua estréia e continuar produzindo som de qualidade.

Lado 1
I Saw Her Standing There
"Seventeen" este foi o nome desta canção desde o dia em que foi composta por Paul, sendo apresentada assim em Hamburgo, no Star Club e até no Cavern Club. Foi gravada oficialmente em 11 de fevereiro, quando recebeu 12 takes. Diz a lenda que Paul teria escrito-a em 61 com "never been a beauty queen" e que a cantava assim nos shows da banda, até John sugerir-lhe "You know what I mean". A sincronia das guitarras é surpreendente, mas é a cozinha (Ringo e Paul) que tornou esta canção numa das mais difíceis de ser reproduzida ao vivo à perfeição - inclusive até por eles mesmos (eu sei que muitas cover a tocam). Para completar eles ainda adicionam palmas. Paul confessou certa vez que as "bass lines" foram inspiradas em "Talkin' About You", de Chuck Berry, que soavam originais e únicas. Nem preciso me aprofundar muito para falar do brilhante backing rocker de John nas partes principais e no middle eight contrastando com a agressividade vocal de Paul.

Misery
A doce e melancólica segunda canção do disco teve 11 takes até que o vocal de John e Paul soassem como um só (no mono, pelo menos). E eles conseguiram, embora possam ter timbres completamente diferentes, eles conseguem timbrar muito bem e o dueto só é percebido em alguns trechos. Foi escrita por uma cantora chamada Helen Shapiro, muito conhecida na época, até mais que eles, mas parece que o seu empresário não a deixou gravá-la e acabou sendo gravada por Kenny Lynch. No final, eles homenageiam o vocal típico dos grupos americanos femininos com "La la la la la...".

Anna (Go To Him)
O primeiro cover do disco foi gravada em três takes. John demonstra pela primeira vez em estúdio a sua característica vocal ao interpretar baladas: geralmente começa doce como a melodia e aos poucos vai ficando com um tom agressivo. Paul e George também não deixam a desejar, segurando bem o clima romântico da melodia.

Chains
George põe para fora uma dose de sua agressividade - e seu marcante sotaque - dividindo o vocal com Paul e John. Este tributo a Gerry Goffin e Carole King, uma das duplas de compositores que influenciou-os e também às Cookies, grupo feminino americano, recebeu 4 takes. John faz a introdução na gaita e o andamento agilizado.

Boys
Agora é a vez de Ringo provar a que veio. E fez isso com um só take. De novo, eles pagam tributo ao vocal dos grupos femininos americanos, desta vez das muito conhecidas Shirelles. Diz-se que foi necessário um "faded ending" porque ficou grande demais para a época.

Ask Me Why
Escrita em 62. Uma de suas primeiras audições foi no lendário Star Club, da Alemanha. Mas sem dúvida, esta versão do disco é a mesma do single "Please Please Me"/"Ask Me Why" que foi gravada em 26 de novembro e lançado em 11 de janeiro, alcançando o primeiro lugar nas paradas. Foram feitos apenas seis takes, um feito, pois não é das mais fáceis de ser executada, apresentando um belo arranjo vocal e instrumental. De novo John faz uso de sua doce agressividade vocal.

Please Please Me
Foi inspirada numa canção de Bing Crosby chamada Please que sua mãe costumava cantar que usava os sentidos de Please (agradar e por favor). Ficando "Por favor, agrade-me". Conta a lenda que já nas sessões de Love Me Do e P.S. I Love You, Martin já sabia que Love Me Do ficaria entre as primeiras, mas, que precisavam de um primeiro lugar e que How Do You Do It de um compositor do cast da gravadora. Apesar de gravarem-na eles não queriam lançar e sugeriram que fosse dada a Gerry and the Pacemakers, outro grupo de Liverpool, seu antigo rival. Martin os desafiou a compor algo melhor, então eles apresentaram Please Please Me, que parecia de Roy Orbison com um vocal meio bluesy. Martin achou os acordes muito bons, mas achou que seria melhor uma melodia mais rápida e a repetição da primeira parte no final. Era uma boa música que não poderia ser desprezada, mas não havia motivos para colocá-la como seu próximo single. No dia 26 de novembro eles a apresentaram novamente, já reestruturada e com o solo de gaita, deixando George Martin tão impressionado que ele exclamou : "Senhores, vocês acabam de gravar seu primeiro número um". Há ainda uma estória a respeito destas sessões: Martin havia acabado de comprar uma gravata, da qual estava especialmente orgulhoso e a estava estreando neste dia. Com a intenção de deixar os liverpudlianos a vontade disse: "Caso vocês não gostem de alguma coisa é só falar" e George não perdeu a oportunidade: "Bem, para começar eu não gosto da sua gravata" Todos ficaram sérios, mas, acabaram dando boas risadas. Na reprise da letra Last night... Paul canta: I know you never even try girl, mas John canta I know I never, como no início. É quase imperceptível, se você estiver desatento.

Lado 2
Love Me Do
Foi escrita em 58, pertecendo à primeira safra de originais, ainda de McCartney-Lennon. Foi inspirada no estilo Buddy Holly de compor e no estilo dos Everly Brothers de cantar, artistas brancos do country/rock americano que muito influenciaram os rapazes neste período. A primeira canção gravada na Parlophone, em 6 de junho, com Pete Best na bateria, o que resultou na observação de Martin que precisavam de outro baterista no estúdio. O que para eles não era uma boa idéia, pois era uma enganação. Com isso Pete Best foi trocado e Ringo, um velho amigo tomou seu lugar. E com ele gravaram a versão de "Love Me Do" do compacto, sem pandeiro datada de 4 de setembro. Foram feitas umas quinze versões, insatisfatórias para Martin. A próxima sessão foi no dia 11 de setembro, sob a produção de Ron Richards que chamaram Andy White, um experiente baterista que já havia tocado com Bill Halley, quando este veio à Inglaterra em 57 - Paul assistiu este show, em Liverpool. Ringo teve que contentar-se com o pandeiro, muito bem tocado, por sinal. E esta foi a versão do álbum, a mais conhecida até. Conta a lenda que era John quem fazia o vocal principal e partia em seguida para a gaita, o que não agradou Martin, que sugeriu que Paul o fizesse. Paul tremeu, pois não estava preparado. Felizmente Paul aprendeu-o muito bem, assim como Ringo desenvolveu seu próprio estilo de tocá-la.

P.S. I Love You
A gravação data de 11 de setembro, assim como "Love Me Do" e apresenta White na bateria e Ringo nas maracas. Trata-se de uma melodia de inspiração latina, pois a música latina como o cha-cha-cha, a rumba, o calipso e a bossa-nova estavam em moda na época. É Paul quem canta os vocais sendo apoiado por John. Parece que Paul queria que ela fosse o lado A, mas Richards disse como ex-editor musical tinha uma idéia de que alguém já havia lançado um single com este título. Então ela entrou como lado B.

Baby It's You
Gravada pela primeira vez em 11 de fevereiro em três takes. Aqui John faz uso novamente de seu vocal doce de balada que vai se tornando agressivo com o decorrer da melodia - inspirado, sem dúvida, nos vocais negros. É outro cover das Shirelles.

Do You Want o Know a Secret?
Esta canção foi inspirada numa outra chamada "Wishing", do filme White Snow, que Julia costumava cantar-lhe. Já a melodia foi inspirada em "I Realy Love You". Trata-se do segundo vocal principal de George no disco, que faz uso de um timbre doce para contar o segredo de estar apaixonado há algumas semanas à uma garota. Foram feitos 8 takes. George entra sozinho sendo acompanhado apenas por uma guitarra, em "Listen" os instrumentos entram todos juntos. Porém, só no segundo é que John e Paul entram nos backing "doo-a-doo" típico dos cantores de doo-wop. O melhor take foi exatamente o oitavo com sobreposição do 6. Foi gravada também por Billy J. Kramer And the Dakotas, outro grupo de Epstein, da cidade, chegando ao primeiro lugar

A Taste Of Honey
Canção tema do musical e do filme de mesmo nome. Como não poderia deixar de ser é Paul quem está nos vocais dobrados desta canção de toque latino. Foi a primeira vez que eles fizeram uso do recurso de dobrar a voz e para isso foi necessário sobrepocionar uma gravação sobre a outra, sincronizando-as para dar um efeito cheio. Foram pegos os takes 7 e 5.

There's A Place

Embora, pareça uma versão de "Please Please Me", esta foi inspirada no estilo dos cantores negros da Motown. Foi a primeira canção a ser gravada naquele dia, sendo necessários 10 takes. Alguns deles só com solos de gaita. A beleza das harmonias vocais merece destaque: John canta a melodia, sendo apoiado pela harmonia aguda de Paul e no final quando todos já estavam acostumados a isso, George aparece cantando a voz grave e John pula para uma voz intermediária. Apesar de ainda abordar temas românticos, esta letra já demonstra maturidade, pois trata de um lugar onde o autor (provavelmente John) pode ir e lá refletir sobre a vida e sua garota.

Twist And Shout
Cover de um hit de 58 do grupo negro de soul Isley Brothers. Já era tarde e os Beatles haviam passado o dia 11 inteiro gravando, e John que já estava com gripe se encontrava agora com a garganta dolorida, mas, ainda não haviam encontrado uma música para fechar o album, então alguém sugeriu que ele deveria cantar "Twist And Shout", apesar da versão original ser cantada por um cantor de voz mais aguda como Paul. John, apesar de tudo, não titubeou, chupou umas pastilhas e tomou um copo de leite quente e mandou ver, sendo apoiado por Georgee Paul. Foi feito apenas um take, embora se tenha documentos de um segundo take, não foi achado nenhum registro discográfico e George Martin disse que queria um segundo, mas, que John não aguentaria fazer tudo de novo. Diz-se que todos ficaram boquiabertos, pois nunca haviam visto um grupo ainda ter pique para cantar e tocar daquela forma depois de mais de dez horas de gravação e com gripe, Martin até comentou "Eu não sei como fazem isso. Estivemos gravando o dia inteiro e quanto mais tempo isto leva mais eles conseguem". Os colegas de Martin também ficaram maravilhados e levaram uma cópia que tocaram para cada colega, e todos ficavam surpresos. Eram 22 horas da noite, estava na hora de fechar os estúdios. 5 minutos depois qualquer músico do cast da Abbey Road já estaria nas plataformas da Estação de metrô St. John's Wood, mas os Beatles não se mostravam cansados e queriam ouvir algumas gravações. Então, Brian Epstein ofereceu-se para levá-los de carros às suas casas. Ninguém nunca havia visto um grupo assim.

Por Marcelo Scavazza Sanches

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