Quando George Harrison morreu, em novembro de 2001, deixou um álbum praticamente pronto, com uma coleção de músicas gravadas e instruções bem precisas sobre como ele deveria ser finalizado. O resultado foi o álbum Brainwashed, lançado no ano seguinte, produzido por Dhani Harrison e Jeff Lyne.
Mas e antes disso? Seu último álbum lançado foi o Cloud Nine, de 1987. Após isso, um grande hiato em lançamentos e, numa época em que a Internet ainda estava apenas começando, poucas eram as informações sobre as atividades de George.
Muitas lendas e mitos foram levantadas nesses 14 anos de aparente inatividade, principalmente dando conta de que ele havia se tornado uma espécie de eremita, dedicando-se apenas à jardinagem. Poucas eram as informações, mas os fãs mais interessados sabiam de algumas atividades artísticas- muitas, na verdade.
É absolutamente falso dizer que nada fez na última década e meia de vida. George formou em 1988 o derradeiro super-grupo de rock do século passado, os Traveling Wilbury's e com eles gravou dois álbuns, singles, um mini-documentário e videoclipes. Chegaram a pensar em excursionar, o que não ocorreu por conta do falecimento de Roy Orbison. George também fez canções de encomenda para amigos como Eric Clapton, incluiu faixas em trilhas sonoras de filmes, produziu um álbum de caridade.
Saiu em turnê pelo Japão e daí editou um irretocável disco duplo ao vivo. Há mais. O beatle místico participou de um sem número de discos de companheiros da cena rocker, lançou singles próprios, três livros, uma coletânea, e ninguém pode esquecer seu concerto de 1992 no Royal Albert Hall em favor do obscuro Partido da Lei Natural, reeditando no mais nobre dos palcos ingleses, a banda e o show que fez na Terra do Sol Nascente.
Naquele mesmo ano George Harrison foi um dos luminares da festa pelos 30 anos de carreira de Bob Dylan no Madison Square Garden. E mais: com Ringo Starr e Paul McCartney, participou ativamente das ações que resultaram nos relançamentos das coletâneas Azul & Vermelha e do histórico álbum da BBC. Fez o projeto Anthology, Yellow Submarine Songtrack e The Beatles One. Voltemos então ao objetivo principal dessa divagação toda.
O pesquisador Cláudio Teran buscou as músicas que poderiam formar um hipotético CD, seguindo algumas regras. À imagem e semelhança do que seria uma continuação de Cloud Nine, necessitava de onze faixas publicadas após esse período. Música anterior a 1987 só teria chance se fosse absolutamente inédita. Foram eliminadas gravações ao vivo de takes já conhecidos. Haveria liberdade para recorrer à pirataria se uma canção relevante para o projeto só estivesse disponível nessa forma. Nao final, alinhando as faixas cronologicamente, o resultado foi surpreendente.
E o que fazer com essa coleção de músicas? Na época, em 2001, o Portal Beatles Brasil criou uma promoção e sorteou algumas cópias, para alguns poucos felizardos, entre muitos que responderam à seguinte questão: "você já sonhou com os Beatles?". A relação das músicas, com suas devidas explicações encontram-se abaixo. Lembrando, claro, que foi antes do lançamento do Brainwashed - não se podia prever, mas duas delas foram lançadas no álbum póstumo.
George Harrison - After Cloud Nine (2001)
MO: composição de 1977. Entrou no projeto porque veio à luz somente em 1994, e para um CD em edição limitada com o objetivo de homenagear Mo Ostin, capo da Warner que se aposentava. Provavelmente foi retrabalhada para esse lançamento.RIDE RAJBUN: gravação de 1992, lançada em 1995 no escasso CD com a trilha sonora do desenho animado Bunbury Tails. George está acompanhado de Ravi Shankar e do filho Dhani. A faixa soa como uma evolução para "Blue Jay Way" ou "Within'You Without You".
HEADING FOR THE LIGHT: faixa-solo incluída no primeiro disco dos Traveling Wilbury's.
CHEER DOWN: composição que Eric Clapton esnobou. George gravou e a editou como um single, incluindo-a em seguida na trilha sonora de Máquina Mortífera 2.
POOR LITTLE GIRL: editada para a coletânea Best of Dark Horse. Canção inspiradíssima que conta ainda com uma versão encurtada especialmente para emissoras de rádio, em CD single.
COCKAMAMIE BUSINESS: candidata a clássico desse álbum imaginário. Uma das faixas que certamente ganharia atenções da mídia se não estivesse perdida numa coletânea (Best of Dark Horse).
MAXINE: faixa-solo das sessões para o segundo álbum com The Traveling Wilbury's, com a diferença que só saiu através do mercado pirata.
ABSOLUTELY SWEET MARIE: George escolheu uma canção pouco divulgada dentro do vasto repertório de Bob Dylan para homenageá-lo no histórico concerto pelos seus 30 anos de carreira. Ao violão, o ex-beatle se destaca pela base competente e segura.
BETWEEN THE DEVIL AND THE DEEP BLUE SEA: O original dessa gravação é de 1931 por Cab Caloway. George sempre gostou de regravar coisas antigas, e entre os exemplos estão "True Love" e "Baltimore Oriole". Essa composição foi pré-gravada em estúdio, e exibida num programa da TV inglesa, Mr. Roadrunner. Destaque para o som do ukelele tocado por George.
MY SWEET LORD 2000: Exceto pela percussão de Ringo e a linha de baixo, George regravou quase completamente seu maior clássico na carreira-solo – questão não entendida pelos críticos. Ele explicou, na entrevista editada no CD promo, A Conversation. De acordo com Harrison, lhe incomodava ter sido processado por plágio, somente por causa de três acordes. Indignado com isso ele providenciou a regravação para divertir-se, e eliminar os 'acordes da discórdia'. Destaque para o potente vocal gospel de Sam Brown.
HORSE TO THE WATER: o esforço derradeiro de George Harrison em vida. Uma canção gravada um mês e meio antes de seu falecimento. Ele se abandona num solo incomum porque longo e sem o habitual recurso do slide. A letra é autobiográfica, destaca-se a base da banda de Jools Holland, e novamente Sam Brown nos vocais. É uma canção tocante, bela, contemporânea - e perdida num CD difícil de encontrar. O fecho perfeito para um imaginário álbum de continuação para Cloud Nine?
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